Conversa sobre as etapas do processo de alfabetização

É importante que as pessoas que convivem com crianças alfabetizandas conheçam as hipóteses de escritas pelas quais as crianças passam para se alfabetizarem.

No processo de alfabetização a criança passa por etapas, com avanços e recuos, até se apossar do código linguístico e dominá-lo.

Muitos pais se sentem ansiosos ou preocupados com a escrita da criança nessa fase. Muitas vezes, consideram que a escrita da criança está errada ou incompleta. Por esses motivos, vale a pena entender, mesmo que de forma superficial, as etapas as quais as crianças passam, nesse processo, para melhor ajudá-las e as incentivá-las. Por outro lado, os professores devem se basear nessas fases para propor atividades adequadas e que estimulem os alunos a evoluírem. É muito importante o professor identificar o nível que cada aluno se encontra, para orientá-lo no processo de construção da escrita e favorecer a ele, várias possibilidades de aprendizagem.

De acordo com a teoria da Psicogênese da Língua e da Escrita, toda criança passa por quatro fases até que esteja alfabetizada, são elas: fase de escrita pré-silábica, escrita silábica, silábica-alfabética e alfabética.

Inicialmente, as crianças rabiscam o papel. É interessante perceber que, nesse período, há um evolução do traço. E o próprio rabisco é muito significativo para criança e também para que o adulto entenda sua evolução. Quando maior a experiência com o lápis e papel, maior deverá ser o seu avanço.

Primeiramente, os traços não têm muitas formas, pois, não há um controle motor do movimento. A criança escreve pelo prazer do movimento e não há uma representação de um desenho, pois, usa linhas mais retas e a ocupação do espaço não obedece a regras. Aos poucos, com o aprimoramento da coordenação motora, há uma conquista de movimentos circulares e tentativas de representação de objetos, muitas vezes sem forma (garatujas). Com o avanço, ela consegue relatar o que desenhou, mesmo com o desenho sem formas e a criança vai tentando relacionar sua escrita a objetos e situações de seu ambiente cotidiano.


Escrita pré-silábica

Nessa fase, a criança pensa que está “escrevendo” e diante da realidade/verdade dela, está escrevendo palavras. Ela começa perceber que a escrita representa aquilo que é falado. E tenta se aventurar pela escrita por meio da reprodução de rabiscos e desenhos. Ainda não compreende que a escrita das letras e palavras são relacionadas com os sons da língua falada. Neste momento a criança não busca correspondência da escrita com o som. Podemos dividir essa fase em duas etapas:

I – Indiferenciado
Nesta etapa a criança pensa que se escreve com desenhos. As letras não significam quase nada para ela. A professora pede que ele escreva “peteca”, por exemplo, e ele desenha uma peteca, faz rabiscos e garatujas.

II – Diferenciado
O aluno já sabe que não se escreve com desenhos. Ele já usa letras ou, se não conhece ou não sabe desenhar a letra, usa algum tipo de sinal, números, símbolos ou rabisco que lembre letras.
Nessa fase o aprendiz ainda não compreende que as letras possuem relação com os sons da fala. Ele só sabe que se escreve com símbolos, mas não relaciona esses símbolos com a língua oral. Acha que coisas grandes devem ter nomes com muitas letras e coisas pequenas devem ter nomes com poucas letras. Acredita também que para uma palavra possa ser lida ela deve ter pelo menos três símbolos, por isso, não há um controle de número de letras para cada palavra. Para se sentir mais confortável, utiliza muitas letras para escrever uma palavra, independente do número de sílabas. E pode também acontecer da criança usar as mesmas letras para tentar escrever diferentes palavras (geralmente letras que está mais acostumada, como as letras do seu nome).

Exemplos:
UEMDHGASIEJANDMELISJENFGEUYSN (bola)
KPENBAHDUELSNROCMAROENKSIRISI (brigadeiro)
NMENBAUEBVFAXZREQPOWMNRUUWU (mão)
OEICMSHEURTQAPCMENVISUBNVERHU (caderno)


Escrita silábica

A criança começa a perceber a correspondência entre as letras com aquilo que é falado. Começa a fazer uma reflexão sobre o que se está escrevendo. Interpreta a letra a sua maneira, atribuindo valor de sílaba a cada uma – cada sílaba representa uma letra. Ela percebe que as letras representam os sons da fala, mas pensa que cada letra é uma sílaba oral. Se alguém lhe pergunta quantas letras é necessário para escrever “macaco”, por exemplo, ele repete a palavra para si mesmo, devagar, contando as sílabas orais e responde: – três, uma para “ma”, uma para “ca”, e uma para “co”.
Dentro dessa fase podemos identificar duas etapas importantes:

1. SEM SIGNIFICAÇÃO
Para cada sílaba o aluno põe uma letra sem pensar na correspondência sonora.

2. COM SIGNIFICAÇÃO
Escreve para cada sílaba uma letra que realmente existe na sílaba.

Exemplo: para macaco escreve
“aao” – a para “ma”, outro a para “ca” e o para “co” ou
“mcc” – m para “ma”, c para “ca” e outro c para “co” ou
“mao” – m para “ma”, a para “ca” e o para “co” e assim por diante


Escrita silábica-alfabética

A criança compreende que as sílabas possuem mais que uma letra. Ao ter consciência da importância do uso das vogais e/ou consoantes na escrita de uma palavra, busca fazer uso de ambas. No início combina escritas silábicas com escritas alfabéticas em uma mesma palavra. Mistura a lógica da fase anterior com a identificação de algumas sílabas; ora escreve as sílabas completas (simples) e ora usa apenas uma letra para representá-la.
Exemplo:
– Para macaco escreve:
maaco – ma para “ma”, a para “ca”, co para “co”
maao – ma para “ma”, a para “ca”, o para “co”
acao – a para “ma”, ca para “ca”, o para “co”

Essa é uma fase de transição entre a escrita silábica e alfabética, por isso, as crianças estão em constante conflito e buscam o conhecimento adquirido na fase anterior. Por isso, acredita que está escrevendo corretamente e se sente feliz por isso.

Acontece que, muitas vezes os adultos a corrigem e ela, então, pode ficar frustrada e achar que não sabe escrever, ou que é algo muito difícil. Então, é preciso ter cuidado ao corrigi-la. Os erros fazem parte do processo e, com isso, ela aprende.

É preciso sempre incentivar e motivá-la. É interessante sempre pedir que leia a palavra e questioná-la, por exemplo, perguntando se não está faltando nenhuma letra.


Escrita alfabética

A criança já consegue reproduzir adequadamente todos os fonemas de uma palavra, caracterizando a escrita convencional. Domina, enfim, o valor das letras e sílabas. A criança já compreendeu como se escreve usando as letras do alfabeto. Porém, não de forma ortográfica (que é uma convenção) mas sim, como o nosso alfabeto permite, com várias letras que representam o mesmo som, ou um som representado de diferentes formas (letras). Nessa fase, ela compreende que cada letra representa um som da fala e que é preciso juntá-las de um jeito que formem sílabas de palavras da nossa língua. Porém, inicialmente, escrevem com fortes marcas da oralidade (o sistema alfabético permite isso, mas, não de forma convencional).

Exemplo: Macacu ao invés de macaco ou tumati ao invés de tomate

Ao atingir a escrita alfabética a criança adquire consciência da função social da escrita e que, quando se escreve, é para que alguém possa ler.

Aos poucos vai interagindo com a linguagem escrita e percebe que ela não é uma representação fiel da fala. Nas primeiras situações de escrita é comum alguns erros como omissão de letras, acréscimos de letras, trocas de letras de sons parecidos, troca de posições de letras, falhas na separação das palavras nas frases, entre outros. Tudo isso é muito normal e também faz parte do processo de uma escrita que exige uma reflexão. Por isso, intervenções e análise da escrita são muito importantes nesse estágio.

As falhas ortográficas, nesse momento, não devem ser considerados como erros, mas sim, prova de que a escrita da criança é resultado de reflexão, exploração, raciocínio, pensamentos e não, apenas uma mera cópia.